O umbelismo pode ser congênito, adquirido por doença ou po acidente. Uma vez umbélico, umbélico para sempre. Houve um tempo em que os umbélicos eram objeto de escárnio, talvez por isso é que eles tenham se isolado cada vez mais do resto do mundo.
No começo se recolhiam individualmente e se escondiam. Depois começaram a descobrir que não eram os únicos e passaram a se associar uns aos outros. Mas nunca mais quiseram se misturar com os humanos, que eles consideram como seres inimigos.
Primeiro surgiram as colônias de umbélicos adultos. Depois, como continuassem a surgir novos umbélicos eles passaram a se preocupar com os infantes e jovens. Criaram escolas exclusivas para eles e clubes onde o acesso só era permitido para quem deixasse à mostra sua desumbiguação.
Com o objetivo de isolarem ainda mais criaram sua própria língua, o bigolês, uma corruptela da língua corrente à qual só eles tinham acesso. Tendo uma língua e só convivendo entre eles começaram a defender a existência de uma identidade particular e a defender essa identidade com unhas e dentes.
O umbelismo então passou a considerar também como inimigos os umbélicos que se aproximavam dos seres humanos. Umbélicos que usavam próteses, chamadas de implantes umbilicais, foram considerados como falsos umbélicos, traidores da identidade e da cultura segregada. Também são considerados traidores os umbélicos que se recusam a aprender ou usar o bigolês como única língua possível.
O maior problema desses seres é que, apesar de não se considerarem humanos, eles vivem nos mesmos lugares que o resto da população e, com isso, tiveram de adotar estratégias de sobrevivência. A primeira deles foi conceder a alguns poucos privilegiados a possibilidade de aprender bigolês.
Em pouco tempo isso passou a ser uma fonte de lucros para esses privilegiados que começaram a vender dicionários de bigolês, serviços de translação linguística e produtos especiais para umbélicos. Claro que isso diminui muito a autonomia dos umbélicos que dependem dos transladores para o seu dia-a-dia, mas a defesa da identidade sempre foi colocada acima de qualquer outro benefício social.
Os humanos têm tentado continuamente incluir os umbélicos na sua sociedade, mas têm enfrentado uma forte resistência, especialmente por parte dos líderes do grupo que temem perder sua influência e poder caso os seus pares se misturem com o resto da humanidade.
Os humanos mais radicais acham que, se os umbélicos preferem a segregação, que a tenham. Os umbélicos mais radicais agora lutam para criar um país independente, a Umbelândia.
É provável que a única solução para esse impasse seja alguma descoberta científica que evite o nascimento de mais desumbigados.
Até lá a tensão continuará.
Fábio.
ResponderExcluirAcrescentando : Os umbêlicos não só se auto excluem , mas tentam, eu disse "apenas tentam" distrair os movimentos de Inclusão.Se auto promovem, vendem marcas, comercializam (falsos) saberes.
Abraços.
Arimar
Fabio,
ResponderExcluirOs umbélicos têm mais uma característica, que geralmente passa desapercebida, para os do clã e para os humanos: seus líderes não falam apenas o bigolês, que defendem encarniçadamente. Oh, não!!
Eles também falam a língua dos humanos. Escondem essa habilidade cuidadosamente e só a utilizam em última instância.
É graças ao domínio da língua dos humanos que conseguem atingir a liderança e se manter lá.
É bom lembrar que a capacidade de falar um idioma é mais do que saber palavras em outra língua. Significa a possibilidade de ordenar o pensamento, de comunicar pensamentos à distãncia, etc, etc.
Seus liderados, ao contrário, sabem apenas o bigolês, que varia de cidade prá cidade, de grupo prá grupo...lembrando o conselho de Nicolau Maquiavél, "Duvidir para governar".
abraços,
Marta Gil
Tentei aprender essa língua, mas foi um desastre...
ResponderExcluirUm abraço
Vilma
A Marta disse tudo, os líderes não se expressam somente em bigolês, é contraditório não?
ResponderExcluirOu alguns umbélicos são mais que os demais?
Aposto minhas próteses auditivas caríssimas e pagas por mim de que essa fábula tão fabulosa vai circular às escondidas nos redutos mais recônditos do poder umbélico.
Sr. Fábio:
ResponderExcluirParabéns pelo texto! Lúcido, íntegro e muito bem escrito. É uma fábula perfeita sobre uma realidade terrível: a manipulação de massas desprotegidas sob o falso argumento de defesa dos interesses destas pessoas, mas, na verdade, visando apenas o alcance de ganhos de poder e outros mais pelos líderes.
Saudações,
Drauzio Jr.
Olá!
ResponderExcluirEsse seu texto trouxe-me até ao seu blog! Adorei o texto, muito subtil mas incisivo na crítica aos que em nome da inclusão se auto-excluem ou excluem os outros. Afinal, «dividir para reinar» era máxima na Europa medieval!!!
Gostei do texto, gostei do blog e fui espreitar os outros blogs para os quais tem links! E confesso, "mea culpa", já comecei a divulgar! Se aparecerem mais comentários lusos, sou eu a culpada!
Obrigada pelo texto e pela partilha connosco das suas ideias e da sua escrita absolutamente irresistíveis!
Misal
Coloquei um link para seu texto no blog dos Surdos Usuários da Língua Portuguesa
ResponderExcluirhttp://www.sulp-surdosusuariosdalinguaportuguesa.blogspot.com
Não consigo entender porque seu texto chamou tanto a atenção em nossa comunidade. Abraços Sô
http://www.youtube.com/watch?v=tAj_QPJrNUA
ResponderExcluirEste vídeo é de uma edição especial sobre inclusão, de uma revista sobre educação, achei que deveria ser divulgado