domingo, 17 de agosto de 2008

Xiita Convidada - A audiodescrição, a inclusão e a Natura

*Marta Gil

"Não pense que não há crocodilos só porque a água está calma." Provérbio malaio


A área da Deficiência anda em festa, pois há muito que comemorar, nos últimos tempos.

A audiodescrição (AD) é um dos fatos mais recentes: a Portaria N.o 466 (30/07/2008) concede o prazo de noventa dias para que as exploradoras de serviço de radiodifusão de sons e imagens e de serviço de retransmissão de televisão (RTV) acrescentem, na programação por elas exibidas, o recurso da audiodescrição, juntamente com a legenda oculta (closed caption) e a janela em Libras (língua brasileira de sinais).

A Natura foi a primeira empresa brasileira a veicular um comercial com este recurso, na linha Natura Naturé para crianças, criada pela Peralta Strawberry Frog, com audiodescrição feita pela Iguale Comunicação de Acessibilidade.

A audiodescrição é utilizada no Primeiro Mundo desde a década de 80, mas só agora está chegando ao Brasil.Graças a iniciativas como a da Natura, a partir de agora a tecla SAP será freqüentemente acionada para comerciais, filmes e programas.

Marco Antonio de Queiroz, programador de sistemas e cego, traduz a importância deste recurso:
A audiodescrição é a arte de deixar imagens audíveis e de nos incluir culturalmente em um mundo onde uma imagem vale mais que mil palavras. Esse anúncio da Natura, especialmente para aqueles com deficiência visual, deficiência intelectual, disléxicos e idosos, é um marco histórico de acessibilidade que nos traz compreensão, através de informação, antes somente visual. Informação, isso, informação!

Este anúncio é só um pontinho, um pontinho a que se seguirão outros. Audiodescrição profissional e comercial. Não será favor, é lei, não será favor, é pago.

Recursos de acessibilidade na comunicação (como audiodescrição, legenda oculta e closed caption) indicam a crescente visibilidade que a temática da Deficiência vem conseguindo, graças à decidida atuação de pessoas com deficiência e suas entidades representativas, a avanços tecnológicos, que também apresentam soluções para transporte, educação, trabalho, esporte e lazer e à incorporação de valores como equidade de oportunidade, valorização da diversidade e acessibilidade.

Ao entrar de forma cada vez mais expressiva no mercado de trabalho (como demonstram as estatísticas) as PcD assumem o protagonismo de suas próprias vidas, fortalecendo sua autonomia e desempenhando funções que não seriam consideradas possíveis há 5 ou 10 anos; como consumidoras, começam a influenciar o mercado; como cidadãs, começam a ocupar o espaço político; são vistas com mais freqüência nos espaços públicos.

A legislação brasileira e os marcos conceituais internacionais inserem a Deficiência no âmbito dos Direitos Humanos. Essa concepção está presente nos documentos abaixo destacados. Esse é o pano de fundo onde a conquista da AD se insere. Foi esse cenário que embasou a elaboração da Portaria N.o 466 – e de outros documentos legais.

Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência

Aprovada pela ONU em 2006, entrou em vigor internacionalmente a 3 de maio de 2008 e foi ratificada pelo Brasil, juntamente com o Protocolo facultativo, dia 10 de julho, como Decreto Legislativo 186/2008. Tornou-se, desta forma, o primeiro tratado internacional a vigorar no país com status constitucional.

O texto, escrito em parceria com ativistas do movimento social das pessoas com deficiência de todo mundo, ressalta a importância da acessibilidade aos meios físico, social, econômico e cultural, à saúde, à educação e à informação e comunicação, para possibilitar o pleno gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais. Além disso, considera a negação de inclusão e de acesso como crime de discriminação.

Declaração da Década (2006-2016) das Américas pelos Direitos e pela Dignidade das Pessoas com Deficiência

Aprovada pela Organização dos Estados Americanos (OEA) em junho de 2007, enfatiza a necessidade de efetivação de programas, planos e ações para alcançar a inclusão e a participação plena em todos os aspectos da sociedade pelas pessoas com deficiência.

Agenda Social de Inclusão das Pessoas com Deficiência e Controle Social

Lançada pelo Governo Federal em outubro de 2007, prevê medidas como concessão de órteses e próteses, acessibilidade na habitação, nos transportes, nas escolas, inserção no mercado de trabalho e campanhas educativas. O objetivo é estimular a inclusão da PcD no processo de desenvolvimento do país, buscando eliminar todas as formas de discriminação e garantir o acesso aos bens e serviços da comunidade.

*Marta Gil : Consultora, Coordenadora Executiva do Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas, é socióloga, atua na área da Deficiência desde 1976. É uma das fundadoras Amankay Instituto de Estudos e Pesquisas. É Fellow pela Ashoka Empreendedores Sociais. Foi coordenadora da da Rede SACI – Solidariedade, Apoio, Comunicação e Informação. Atualmente trabalha como consultora autônoma. Coordenou o Manual “O que as empresas podem fazer pela inclusão de pessoas com deficiência”, publicado pelo Instituto Ethos (2202) e o livro “Educação Inclusiva – o que o professor tem a ver com isso” (2006).Tem artigos publicados em revistas e sites. Conferencista em eventos nacionais e internacionais falando sobre os temas de Redes de informação e comunicação e Inclusão, sobretudo de pessoas com deficiência.

Descrição da imagem : um aparelho de televisão descrevendo uma paisagem : "céu azul, o sol brilhando sobre um campo de flores amarelas"

3 comentários:

Anônimo disse...

Fabio querido! Seu blog é sensacional, e eu queria te fazer um pedido: NÃO DEIXE DE ESCREVÊ-LO NUNCA MAIS!!! Obrigada pela leitura de qualidade que você nos compartilha, eu sei que já te disse isso outra vez, mas: adoro o jeito que você coloca as palavras! Seja na escrita, seja em palestras.
Beijo na família linda!
Cris - mãe do Bernardo e da Valentina.

Unknown disse...

Oi Fábio, boas!

Realmente, essa portaria assinada pelo ministro Hélio Costa foi uma luta, uma luta organizada pelo nosso amigo e meu gurú Paulo Romeu, cego como eu, onde tivemos de unir forças com os profissionais audiodescritores existentes no país, para mostrarmos que não estava despercebido o adiamento regulamentado por outra portaria, a 413, anterior a atual.

Tudo isso porque as TVs diziam não haver audiodescritores no país e que não estavam preparadas para oferecer esta tecnologia para nós. Provamos a eles, com audiodescritores em punho indo ao próprio ministério como prova de nossos argumentos, que as TVs não conseguiam encontrar em 2 anos, aqueles profissionais que já conhecíamos há anos, mas que não fomos procurados para apresentar. Porque procurar por nós, e como, se somos sempre invisíveis?
Estamos aí!

Abraços acessíveis e inclusivos do MAQ.

Alexandre Melo disse...

Alo Fabio, como vai?

Desculpa, inserir por aqui, mas não encontrei seu email de contato!

Meu nome é Alexandre Melo e estreei esta semana o site do meu primeiro filme/documentario que fala sobre o cotidiano dos anoes.

Quero lhe convidar a assistir e opinar!! O filme ficará disponivel, na íntegra, no site pelo link "Assista ao Filme".

Endereço:

http://nossagrandevida.com.br

Aguardo sua visita

Abraços,
Ale Melo