segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Uma posição Maior

 Izabel Maior*

Você, e quem mais desejar, pode dar publicidade à minha opinião com referência ao tema educação inclusiva, como convicção e como diretriz de política pública que sempre defendi. Mesmo antes de chegar à Brasília, ter construído a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência e ocupado um dos cargos mais cobiçados da gestão pública federal, a experiência prática de professora me dizia que inclusão começa no primeiro espaço institucional ao qual todas as pessoas precisam ter acesso em bases iguais - a escola.

Prezados,

Quero voltar alguns anos de luta para lembrar que a situação revelada no "preferencialmente" fazia algum sentido na década de 80, quando o modelo da inclusão era apenas uma possibilidade, até mesmo pela falta de investimento da área governamental em políticas sociais, entre elas a de educação inclusiva para as pessoas com deficiência.

Atravessamos tempestades até que se firmou o documento "educação especial na perspectiva da educação inclusiva" no início do século XXI. O debate de ideias e, muitas vezes, o confronto de ideias e interesses parecia ter encontrado convivência com a instituição do AEE, a dupla jornada e o financiamento da rede não governamental pelo FUNDEB. Surgiram as iniciativas do PDE e da Agenda Social de Inclusão das PcD em 2007, com forte apoio à educação especial inclusiva, em ambiente inclusivo na rede regular de ensino, com acessibilidade, capacitação dos professores e tecnologia assistiva.

Talvez algumas pessoas não conheçam a importância da participação do Brasil nos debates na ONU em 2005 e 2006, quando a redação da CDPD chegava ao ponto que, mal comparando, agora se apresenta a Meta 4 do PNE. Sustentamos a educação inclusiva em todos os níveis de ensino a despeito de potências hegemônicas pretenderem a educação especial separada,  particularmente para as pessoas com deficiência intelectual. Um dos motivos que nos moveu para garantir a educação inclusiva na CDPD foi a certeza de que o texto da Convenção seria adotado como emenda à Constituição e deixaria para a história o termo "preferencialmente", por estar culturalmente e legalmente superado como o foi com o advento do Decreto 6949/2009.

Mas o que se vê é uma redação NÃO consensuada na qual o governo federal desiste de sua própria construção política e opção pela educação inclusiva e resgata a posição dúbia do "preferencialmente", parecendo se envergonhar das escolhas anteriores.

Não existe a possibilidade de "preferencialmente" após 2009. O único texto constitucional referente à educação das pessoas com deficiência é o texto da CDPD, o qual é claro ao adotar a educação inclusiva.

Reinserir a dúvida de comando em um plano nacional da educação, de horizonte decenal, é abrir mão de muitas crianças e jovens com deficiência que podem não receber a educação inclusiva como aconteceu no passado, mesmo na vigência da CDPD no Brasil.

Não aceito e não pactuo com as manobras políticas comandadas pela equipe a frente do MEC e tampouco com pessoas que em nome do movimento apresentam uma proposta de redação da Meta 4 divorciada daquela que foi debatida e saiu vencedora na CONAE. Alguns dos que se sentaram à mesa de negociação se dizem conhecedores do espírito da CDPD, mas não é esse o resultado alcançado na redação proposta para apoio junto ao relator.

É bem mais digno lutar até à votação final sem abrir mão da defesa da educação inclusiva. Não se  deve esquecer que setembro é o mês da nossa luta e ainda há tempo de não aceitar o retrocesso do rolo compressor de sempre.

Saudações,

Izabel Maior

Caso você não saiba quem é Izabel Maior, leia aqui

Descrição da imagem: foto de Izabel Maior falando num microfone, em foto da Revista Sentidos

domingo, 15 de setembro de 2013

O nonsense do consenso

A nova palavra a moda na proposta de educação inclusiva do MEC é "consenso".

Busca-se um consenso para evitar a perda de muitos votos que garantem a eleição de políticos por esses brasis afora. Votos conquistados em troca de migalhas de benefícios e privilégios ou de promessa de um atendimento "especial" aquelas pessoas que não recebem da sociedade um mínimo de dignidade e respeito e, por isso, se satisfazem com as migalhas e com qualquer outra coisa que lhe ofereçam.

O curioso é que esse consenso que se propõe não segue a regra básica que é a de que é só pode ser obtido se ambas as partes cederem, concordarem e discordarem, obtendo um resultado final diferente do ponto de partida, com benefícios e perdas comuns a ambas as partes ou até mesmo com a construção de uma nova solução, que incorpore a soma de ambas as posições.

O consenso proposto é apenas uma forma da parte que sempre lucrou, continuar lucrando (literalmente, pois está preocupada com as polpudas verbas públicas que recebe) e da parte que sempre foi estigmatizada continuar a sê-lo.

Um consenso que afronta todas as leis e acordos internacionais existentes.

Um consenso que perpetua a segregação, o preconceito, o desrespeito ao ser humano.

Com esse consenso ficamos onde sempre estivemos, reféns de políticos que atendem seus interesses eleitoreiros...

Mas, já que a educação inclusiva pode ter redação consensuada...ou seja, manter o status quo de não ter inclusão nenhuma, eu sugiro o seguinte:

Consensuar a lei de cotas e dar uma mãozinho para os empresários, coitadinhos, que precisam se livrar desses trastes;

Consensuar a a lei de acessibilidade e não precisar ficar fazendo reformas e construções caras;

Consensuar a convenção internacional e transformar tudo em pizza;

Consensuar a declaração internacional dos direitos humanos, para que direitos humanos?

Consensuar a constituição...

O que nós precisamos é de bom senso, mas acho que aí eu já estou pedindo demais para a nossa classe política.

Descrição da imagem: cartum do Junião, onde um monte de pequenos seres engravatados (políticos?) fazem fila para se esconder debaixo de uma enorme pizza.